Diário de bordo do processo de ensaios da peça OUTROS TEMPOS (Old Times), de Harold Pinter, no Rio de Janeiro. Em cartaz no Rio de Janeiro no TEATRO DULCINA (16/09 a 25/09, sex-dom 19h), depois no ESPAÇO SÉRGIO PORTO (30/09 a 30/10, sex-sab 21h, dom 20h)
quarta-feira, 25 de maio de 2011
Pinter e Cassavetes
Essa semana entramos numa parte do texto muito difícil, em que Anna e Deeley começam a competir por Kate cantando antigas canções, criando uma situação ao mesmo tempo constrangedora e engraçada. Pelo menos essa é a nossa concepção da cena, pois o Pinter só diz "Deeley (cantando)" e "Anna (cantando)", seguido da letra de uma música antiga. Mas analisando o texto e seguindo a mesma lógica de que eles estão sempre se bicando, competindo de formas diferentes pela atenção de Kate, chegamos a esse desenho, de que eles estão competindo pra ver quem lembra das canções antigas que Kate adora. Nosso desafio é criar na cena esse constrangimento: de repente, do nada, uma das pessoas na sala começa a cantar uma música, a outra interrompe com outra música, e os dois começam a competir pra ver quem canta a música que mais vai agradar à terceira... patético, constrangedor, e absolutamente humano. Impossível não lembrar dessa cena de FACES, de John Cassavetes, filme que já vi dezenas de vezes, literalmente - a ponto de me perguntar se realmente o filme lembra tanto a peça ou se é a minha obsessão com o filme que me faz querer adaptar o mundo àquelas imagens. Nelas, dois amigos dançam com uma prostituta (Gena Rowlands), animados, felizes, até que (por volta do minuto 3:30), ela começa a dar mais atenção a um deles, e o outro começa a se sentir excluído, começa a cantar mais alto, espernear, fazendo de tudo pra chamar a atenção. Até que a mulher percebe, se aproxima dele, tentando fazer um carinho, o abraça, e então ele pergunta, seco, "quanto você cobra?". Patético, constrangedor, e lindamente humano. Como Dostoievski. Como Pinter.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário